Empreendedorismo Nº 2
Desde que nasceu o Gilmar acompanha o pai no caminhão de reboque. Aliás, nasceu ali mesmo, no meio do caminho para a maternidade. Trinta anos dentro daquele caminhão. Tanto que nunca se imaginou trabalhando em outro lugar que não fosse o “Auto-Socorro e Oficina do Alfredo”. Não porque ele pensava que aquela era a melhor coisa do mundo, mas talvez porque ele nunca tinha pensado no assunto. Só trabalhava lá. Todo dia. Às vezes de noite e de madrugada também.
Conhecia a cidade inteira. Ainda moleque já era bom de prosa. Sabia conversar com qualquer um sem precisar falar do tempo ou falar mal de político. Foi por isso que as pessoas começaram a se abrir com ele, contar os problemas. Ele guinchava um carro e ia escutando as lamentações. Era um ouvinte de primeira. Mas o pai reclamava. ‘Tanto serviço pra fazer e você aí de prosa com os freguês’.
Mal sabia que futuro aquilo traria. Com o tempo o pessoal foi pegando mais intimidade e até pedia conselho pro Gilmar. Troca esse carro logo antes de fundir na sua mão. Perdoa ele, minha senhora, o Vanderlei não vive sem você. Tira essa grana parada da poupança e investe em imóvel que você ganha mais! Nem sempre ele acertava ou as pessoas faziam o que ele dizia, mas a procura foi aumentando.
Até que chegou um dia em que o Vanderlei ligou de madrugada. O Gilmar já ia ligando o caminhão, mas não era o carro que tinha estragado. O Vanderlei precisava de uns conselhos. Foi a primeira vez que o “auto-socorro” prestou um serviço completo só pelo telefone. Um sucesso. O Seu Alfredo ficou preocupado. Tudo bem, podia continuar atendendo, mas como ia cobrar pelo serviço?
Mas o Gilmar deu um jeito de novo. Passou a emitir as notas fiscais da oficina mesmo. Discriminava lá: Consertos em geral e cobrava suas consultas. E, afinal, “auto-socorro” e “auto-ajuda” não é mesma coisa? A clientela não tem reclamado. O Vanderlei até largou da amante e vive cheio de cerimônia com a esposa até hoje.
Empreendedorismo
Um empreendedor moderno deve estar atento às oportunidades. E o Getúlio sempre soube disso. Eram as oportunidades que estavam meio teimosas em não aparecer. Enquanto isso, a Lourdes, coitada, se virava pra pagar as contas de casa. Ele vinha guardando umas economias desde o FGTS do último emprego há uns cinco anos, a espera da tal oportunidade.
Foi numa quarta-feira, quando a Lourdes chegou em casa, que ele deu a notícia, já de malas prontas. “Vamos pro Sul”. Ela pensou em dizer, não, pára com isso, mas tinha uma confiança meio inexplicável no marido e, também, desde pequenininha tem uma vontade danada de conhecer Foz do Iguaçu.
Só no caminho que o Getúlio foi explicar o negócio. Ia montar uma churrascaria
O Getúlio explicou que o número era só pra impressionar. Os gaúchos vinham só de três em três, eles tinham que chegar lá arrasando. Os dois que valessem por doze mineiros! Na verdade, de Minas mesmo era só ela. Ele nasceu na região de Piracicaba e veio depois de velho pra cá, mas isso não importava, e ficou nervoso com a esposa. Um grande empreendimento não podia perder tempo com pequenos detalhes!
E foi um sucesso tremendo! A Lourdes escreve pra mãe contando as novidades sempre que tem uma folga. No começo o pessoal ia pra assistir o Getúlio acender a churrasquerinha. Era um Deus nos acuda! Joga álcool, abana, aquela bagunça toda. Às vezes o sal passa um pouco, outras vezes se esquece do sal. É muita coisa pra lembrar também. A gauchada se divertia com isso e enquanto assistia, pedia uma cervejinha, um Cheetos de tira-gosto, picolé pras crianças.
Por fim a Lourdes teve a idéia de fazer um pão de queijo pra acompanhar o churrasco do Getúlio. As vendas foram aumentando. Até contrataram uma mocinha pra atender. Um dia a churrasqueira custou um pouco mais pra acender e a Lourdes ofereceu só o pão de queijo mesmo. Pronto. A Churrascaria 12 Mineiros fazia o melhor pão de queijo de todo o Rio Grande do Sul. Era trabalho que não acabava mais.
O Getúlio disse que vai escrever um livro sobre empreendedorismo, contando sua história de sucesso, dando dicas de como enxergar as oportunidades e tudo o mais. Por enquanto tem só um esboço e se afastou um pouco da churrascaria pra clarear as idéias. A Lourdes trabalha feito Hércules, por 12, fazendo cada dia mais pão de queijo. Anda cada vez mais raro ela escrever pra mãe. Na última carta disse que não vê a hora de conhecer Foz do Iguaçu, mas cadê tempo?