Atchim

Meu avô era botafoguense. Meu pai flamenguista. De todos os tios, 20!, só um torce para um time paulista: é palmeirense. Meu pai foi o torcedor mais doente de todos os doentes que conheci. Sofria com o time. Perdia com o time.

Mas, naquela época, ele vivia um momento de ouro. O Mengo era,exceto para atleticanos, o melhor time do Brasil. Digo, do mundo. Circa 1981. Circo? Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico. Um falso 4-3-3 que ganhou Brasil, Libertadores e o Mundo.

Mas a gente assistia a Record: Silvio Luis, Pedro Luis e Flávio Prado. Pelo que sei, nenhum mano. Não importa. O fato é que eles davam só notícias daquela cidade cinza e corinthiana. Por mais que o São Paulo tivesse um monte de selecionável era o Timão, com seus Doutores, Biro-Biros, Zenons e Atalibas, que merecia destaque naquela telinha cheia de interferências. Mil novecentos e oitenta e um.

Ano em que nasceu meu mano caçula. Ano do título mundial do Mengo. Ano em que o Timão nem apareceu entre os 4 primeiros colocados do paulistinha. Num jogo decisivo veio a desclassificação. Salvo engano, em pleno Morumbi. Para a surpresa d'um moleque de 10-11 anos, a torcida vibrou. Não pela derrota, claro, mas pelo feito. O time tinha sido lanterninha do primeiro turno. Saiu com honras do segundo.

Eu ainda não sabia nada sobre os 23 anos sem títulos; nadica de nada sobre o estigma de "sofredor"; nada sobre aquele time branco e preto. Sabia só que o Mengo era o melhor time do mundo. E via como meu pai sofria toda vez que essa verdade era questionada (com derrotas ou meros empates). Ele sofria por dois ou três dias!

E, de repente, vi aquela multidão, uma tal "fiel", feliz apesar d'uma derrota. Acho que esta é a explicação mais racional para minha opção. Mas desconfio, do fundo de minha alma, que nasci louco, maloqueiro e corinthiano.



Falam hoje que uma criança escolhe um time pelas suas vitórias. Escolha fraca porque nenhuma vitória é perene, eterna. Por isso acredito que torcedores de verdade não escolhem seus times. É o time que escolhe a gente. O Timão me pegou desde então. Para não largar jamais. Minha opção, por improvável que fosse, nunca foi questionada. Meu pai optou pelo Mengo numa época de ouro para o Fogão de seu velho. Ele entendeu. E aceitou.

Sport Club Corinthians Paulista, parabéns pelos seus 100 anos. Participei de quase 30 deles. Queria viver outros 30 tão gratificantes. Azar de quem não saca nada do que estamos combinando. Só louco entende nossas improbabilidades.

Nando Vasconcellos